Quando escrevo sobre as igrejas que me fazem voltar sempre a Paris, pode parecer que mais nada importa nessa indiscutível cidade que é adorada por muitos. Mas não se trata disso, aos poucos vamos conhecer os mistérios que elas podem esconder daqueles viajantes que são alheios à força da energia de um lugar. Desde minha primeira visita a Paris conheci as igrejas sobre as quais me refiro e que me mobilizam a retornar sempre a esse local distante de minha cidade por 12 horas de voo. Não importa, o prazer da sensação de estar num refúgio que ampara e conforta faz ultrapassar todo o sacrifício. Você saberia afirmar sobre quais igrejas me reporto?

Qual seria essa igreja? Ela é indicada como a mais antiga na margem direita do rio Sena.
Você conhece essa igreja? Ela é uma basílica católica inaugurada em 1914.

Escrever sobre essas sedutoras igrejas é para mim um enorme prazer, pois as duas possuem fortes significados para diferentes momentos em que estive em Paris. Vou começar a indicar um pouco da história da Igreja de Saint-Gervais e Saint-Protais (clique para ir ao mapa de localização da igreja), minha preferida na cidade, conhecida como Igreja de Saint-Gervais. A atual construção é de algum período entre os séculos XV e XVI, mas no local já existiram duas antigas paróquias. A primeira foi fundada no século VI, tendo sido reconstruída na segunda metade do séc. XI. Em sua longa história há um fato muito chocante ocorrido durante a Primeira Guerra Mundial, quando a Igreja de Saint-Gervais foi alvejada por um canhão alemão e 91 pessoas morreram.

“Em 29 de março de 1918, um projétil alemão, disparado de um canhão de longo alcance, caiu sobre a igreja, matando 91 pessoas e ferindo outras 68; a explosão derrubou o telhado quando ocorria uma missa num dia de Sexta-Feira Santa. Este foi o pior incidente envolvendo a perda de vidas de civis durante o bombardeio alemão de Paris em 1918”. (trecho retirado do site: https://en.wikipedia.org/wiki/Saint-Gervais-Saint-Protais).

Uma bomba alemã destruiu o telhado da Igreja de Saint-Gervais em 1918.

Foto do site: https://en.wikipedia.org/wiki/Saint-Gervais-Saint-Protais.

A bela fachada da Igreja de Saint-Gervais, em três andares que exibem diferentes tipos de colunas gregas: a dórica, a jônica e a coríntia, em sequência, a partir do 1º piso.
A nave da Saint-Gervais.
O órgão da Saint-Gervais.
A bela fachada da Igreja de Saint-Gervais, com três andares, projetada em 1618 no estilo clássico, inteiramente novo para a época.

Antes de expor o grande motivo de minha enorme predileção pela Igreja de Saint-Gervais, ressalto que, na minha primeira visita, sua fachada já me impactou. Projetada em 1618 pelo arquiteto Salomon de Brosse, introduziu um estilo clássico à obra, que, para o séc. XVII, foi uma inovação. Com três andares, exibe diferentes tipos de colunas gregas, no piso térreo há quatro pares de colunas dóricas e um belo frontão clássico, onde se encontra o pórtico principal (porta central). No segundo piso são quatro pares de colunas jônicas, com as estátuas de Saint-Gervais à direita e a de Saint-Protais do outro lado. Acima desse nível estão dois pares de colunas coríntias emparelhadas, sustentando um frontão curvo. A fachada serviu de modelo para outras igrejas na França e na Europa.

Os três andares.
Saint-Gervais.
As colunas.

Em minha primeira viagem a Paris, caminhando pela região do Marais depois de visitar o Hôtel de Ville (prédio da prefeitura de Paris), tive a grata surpresa de conhecer a Igreja de Saint-Gervais, já que ela se localiza na parte de trás da prefeitura. Acredito que, por conta de estar um pouco escondida, alguns visitantes não a conheçam. Ao entrar na igreja, meu olfato se aguçou, pois no ambiente pude sentir um gostoso aroma de incenso e imediatamente uma sensação de tranquilidade foi me dominando devido a uma suave sinfonia que era tocada no belo e enorme órgão construído no ano de 1601. Não percebi a presença de nenhum auxiliar da igreja e nenhum outro visitante, estava sozinho, aquele ambiente me chamou à reflexão. Sentei-me e contemplei o interior da bela igreja gótica e, sem ser religioso, internalizei a paz. Assim começou minha paixão pela Igreja de Saint-Gervais e, lógico, por Paris.

O som do órgão no vídeo a seguir representa bem o que eu pude ouvir quando entrei pela primeira vez na Igreja de Saint-Gervais no ano de 1995.

Belo interior da Igreja de Saint-Gervais, com o órgão ao fundo, as majestosas colunas e, à direita, o púlpito de madeira talhada com estátuas dos quatro evangelistas.
A nave central da Igreja de Saint-Gervais, com o altar ao fundo, altas colunas e lindos vitrais que promovem, em dias claros, uma linda luz.

O fato marcante nas minhas visitas à igreja de Saint-Gervais ocorreu em 2015. Cheguei em Paris num sábado e na segunda-feira à noite, ao subir as escadarias da parte norte de Montmartre, senti-me muito ofegante e cansado além do normal. No dia seguinte procurei um médico, mas somente na quarta-feira, chegando para uma visita à Saint-Gervais, fui informado por uma enfermeira, do Seguro Viagem, que o meu diagnóstico não era nada bom e que, provavelmente, eu estaria com embolia pulmonar. A orientação foi para que eu não fizesse nenhum tipo de esforço e fosse para o hospital. Na igreja, muito atordoado com a notícia, fiz um pedido: que eu pudesse retornar a Paris. Fui atendido e voltei em dezembro de 2017.

A Capela da Virgem, extremamente expressiva na Igreja de Saint-Gervais, é o local onde os fiéis se prostram diante da santa e pedem que os ampare.
Vitral da Capela da Virgem.

A Capela da Virgem, na parte de trás da igreja, tem um teto abobadado gótico tardio, com uma coroa de pedra suspensa de 2,5 metros de diâmetro e desenhos abstratos que lembram chamas. A sala é usada para meditação silenciosa pelos visitantes da igreja. A capela possui alguns dos mais antigos vitrais em estilo gótico extravagante, feitos por Jean Chastellain em 1517, ilustrando a vida da Virgem Maria. (trecho retirado do site: https://en.wikipedia.org/wiki/Saint-Gervais-Saint-Protais.)

Missa na Igreja de Saint-Gervais e Saint-Protais com coro de freiras e monges da ordem Fraternidade Monástica de Jerusalém. Uma linda missa cantada.

Foto do site: https://paris.fraternites-jerusalem.org/.

Cada ordem religiosa dentro da Igreja Católica possui uma linha de liturgia diferente, sendo assim, as missas são um referencial que as distingue. Como não sou religioso, opto em privilegiar as igrejas que realizam as missas cantadas, pois sinto a emoção do ritual religioso a partir da musicalidade nas belas apresentações do coro de monges e freiras. Na Igreja de Saint-Gervais e Saint-Protais, as missas são cantadas e, na minha opinião, é um momento ímpar e imperdível. Para alguns viajantes a missa pode parecer monótona, mas que cada um faça a sua avaliação. Eu gosto e indico as missas das quintas-feiras, às 18h.

Detalhe do vitral “A Sabedoria de Salomão” realizado por Jean Chastellain em 1531, localizado na capela lateral de São João Batista.

Foto do site: https://fr.wikipedia.org/wiki/Vitrail_de_la_Sagesse_de_Salomon_(%C3%A9glise_Saint-Gervais-Saint-Protais).

Outro destaque de valor artístico inestimado é a Capela Dourada, com uma pequena área de 8m x 4m, sem nenhuma janela de ventilação. É um local com vários painéis, mosaicos e pinturas dispostos nas paredes dessa pequena capela privada que foi financiada em 1627 por um casal de aristocratas franceses, devoto e paroquiano da igreja. Nas paredes e nas abóbadas do teto encontram-se 21 cenas da Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo, atribuídas ao pintor francês Jean de Saint-Igny. 

A Capela Dourada foi sendo decorada durante o período de término das obras da igreja, finalizada no ano de 1634. É um dos mais belos tesouros no interior das igrejas de Paris e, talvez por esse motivo, uma visita à Capela Dourada seja rara e excepcional. Não me lembro de vê-la aberta e nunca consegui marcar visita nos períodos em que estive por lá. No site da igreja: https://openagenda.com/jerusalem-paris/events/ogives-visites-de-leglise?lang=fr. há a informação de que as visitas são aos domingos, às 12h30. Sob a capela está localizada uma adega que serve de cemitério para os membros da família Goussault.

Portal de entrada para a privada Capela Dourada, elaborado em fino acabamento de madeira talhada com detalhes de folhas de ouro.
Detalhes da Capela Dourada, no interior da Igreja de Saint-Gervais. Em destaque o Cristo crucificado, à esquerda, e a Ressureição de Cristo, à direita.

Foto do site: https://fr.wikipedia.org/wiki/Chapelle_dor%C3%A9e_(%C3%A9glise_Saint-Gervais-Saint-Protais_de_Paris)

Para os que adoram obras sacras e que também se afeiçoam por belas pinturas que representam a Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo, indico este vídeo interessante, de uma visita guiada à Capela Dourada, com narração, em francês, da irmã Catherine. Não se importe por não compreender o francês, foque nas imagens, que são perfeitas, impecáveis e raras. Vamos ao vídeo. 

A Capela Dourada

Bela pintura na capela lateral de Santa Ana, próxima da Capela Dourada.
Virgem da dor rodeada de anjos, obra que é uma alusão à famosa “Pietá” de Michelangelo. Essas esculturas são de Jean-Pierre Cortot.
A abside, ou parte dos fundos, da Igreja de Saint-Gervais. O semicírculo é onde se encontra, no interior da igreja, a Capela da Virgem. Verifique a disposição dos vitrais.
A rue des Barres, nos fundos da Igreja de Saint-Gervais e Saint-Protais.

Foto do site: https://en.wikipedia.org/wiki/File:Saint_Gervais_church_from_the_rue_des_Barres,_Paris_26_September_2016.jpg

A Basílica do Sagrado Coração (em francês, Basilique du Sacré-Coeur) é um lindo templo religioso da Igreja Católica que está localizado no bairro de Montmartre, no topo do ponto mais alto de Paris, numa altitude de 130 m, de onde se pode avistar toda a extensão e beleza da cidade. Um dos motivos de minha preferência por essa igreja, já o declarei anteriormente, é minha paixão por missas cantadas, e, na Sacré-Coeur, a que ocorre todo primeiro dia do ano às 11h é indescritível. A homilia tem um aspecto de clamor pela fraternidade mundial e em vários instantes da missa são citados contextos da conjuntura internacional em que os povos sofrem situações de flagelo e aflições por guerras e/ou vulnerabilidades sociais e econômicas. É um sermão que roga a benevolência e união dos povos. Muito emocionante! Já tive a oportunidade de estar presente por duas vezes, em 2011 e 2018.

A bela Basilique du Sacré-Cœur, em Montmartre, no sopé da colina mais alta de Paris.

Foto do site: https://www.dreamstime.com/stock-photos-sacre-coeur-paris-france-image19004843

No monte onde a basílica foi erguida, desde o período dos gauleses e dos romanos, cerimônias e cultos pagãos eram praticados num templo onde veneravam a figura de Marte, deus da guerra e da juventude, e noutro idolatravam Mercúrio, deus do comércio e guia dos viajantes, ambos do panteão da mitologia romana.

Mercúrio, deus dos viajantes
O interior da Basilique du Sacré-Cœur, sempre repleto de fiéis e turistas. Essa é a segunda igreja mais visitada em Paris.

Foto do site: https://br.depositphotos.com/361582486/stock-photo-interior-view-basilica-sacred-heart.html.

Como já foi dito anteriormente, minha paixão pela Basilique du Sacré-Coeur (clique para ir ao mapa de localização da basílica) de Montmartre é devido a suas emocionantes missas com o coro de monges e freiras beneditinos. Então, antes de passar para alguns detalhes impressionantes da igreja, relatarei minhas experiências nos dias de missa. Em 2011 fui com dois amigos céticos quanto a se emocionar durante a missa, mas esperei que ela começasse e então vi que os dois, assim como eu, lacrimejavam bastante.

Que tal, então, assistir a um vídeo de 3 min dessa missa cantada pelos monges e freiras beneditinos? Solte a emoção!

Uma dica de boa aquisição para quem for ao Sacré-Coeur: existe uma loja de objetos religiosos dentro da igreja, onde você encontra CDs com os cânticos litúrgicos dos beneditinos.

Vista panorâmica da Basílica de Sacré-Coeur, destacando a cúpula central e a torre do sino. Imperdível visita!

Outro momento de emoção ocorreu em 2018, quando fui à missa do 1º de janeiro com um amigo que sempre dizia que eu me emociono e acabo chorando sem um bom motivo. Talvez ele não entendesse minha exacerbação da emoção, até que aceitou o convite para assistir à missa cantada na Basílica de Sacré-Coeur. Logo que a missa começou, ele já disse: “a energia daqui é forte!” e então não levou muito tempo para que fosse tomado pela emoção. Eu sempre me emociono e choro, não consigo disfarçar.

O altar da Basilique du Sacré-Cœur é belíssimo. O mosaico de Cristo é uma enorme abóboda montada com pedras esmaltadas e coloridas.

Foto do site: https://viajento.com/2016/05/03/paris-basilique-du-sacre-coeur/.

Qualquer visitante, ao entrar na igreja, fica logo envolvido com a beleza do mosaico do Sagrado Coração de Jesus, com um impactante Cristo vestido de branco, com os braços abertos e ao centro do peito um coração de ouro. Com seus 475 m², é um dos maiores mosaicos modernos do mundo e foi inaugurado em 1923. Ele foi feito a partir da técnica de montagem com pedras de cerâmica vitrificadas e coloridas de formas e tamanhos diversos. É um trabalho muito belo, e não tem como não ficar arrebatado com a energia que o mosaico transmite.  

O altar da Capela da Virgem na Basílica de Sacré-Cœur.

Construída com mármore travertino extraído da região de Seine-et-Marne, o que lhe proporciona uma bela tonalidade branca, a Basílica é um dos monumentos mais visitados da França e tem o formato de uma cruz grega adornada por quatro cúpulas menores, além da cúpula central de mais de 80m de altura. Na abside, uma torre serve de campanário a um sino de três metros de diâmetro e com mais de 26 toneladas, um dos mais pesados do mundo. A arquitetura da Basílica de Sacré-Cœur foi inspirada na arquitetura romana e bizantina e influenciou outros edifícios religiosos do século XX.

Creio que o melhor agora seja desfrutar de fotos com alguns detalhes da imponente Basílica de Sacré-Cœur. 

Uma das cúpulas menores.
A cúpula principal com quatro anjos (de cinco); cada um deles carrega um símbolo da Paixão de Cristo.

Foto do site: https://fr.wikipedia.org/wiki/Basilique_du_Sacr%C3%A9-C%C5%93ur_de_Montmartre.

A nave central.
Detalhe do belo mosaico do Sagrado Coração de Jesus.

Para aqueles que forem a Paris, indico que façam uma pesquisa mais detalhada sobre a Basílica de Sacré-Coeur no site da própria igreja, com a história, tour virtual panorâmico e muito mais. É muito interessante:  http://www.sacre-coeur-montmartre.com/francais/histoire-et-visite/.

Espero que este post sirva como um bom início para conhecer essas e outras belas igrejas de Paris.

Para um viajante que gosta de esmiuçar mais detalhes numa visita, eu indico Adilson Guaiati, um excelente guia oficial e credenciado no Ministério da Cultura da França. Instagram: @sempreparis e e-mail: adilsonsempreparis@gmail.com.

Marque uma ida a Paris, apaixone-se por suas expressivas igrejas e se já as conhece, escreva aqui, ao final do post, o seu comentário quanto a sua predileção.

Imagem de destaque retirada do site: https://www.dreamstime.com/stock-photos-sacre-coeur-paris-france-image19004843

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7 thoughts on “Paris e duas igrejas cativantes.”

  1. Para uma Católica e um basalmo conhece através desse blog igrejas tão bonita, e saber que através de um pedido de intercessão Maria sua fé te curou.

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