A Andaluzia é uma das regiões mais bonitas da Espanha. Fica na parte sul do país e engloba cidades como Sevilha, Málaga, Granada, Córdoba e Cádiz. Ainda menos conhecida do que esses destinos, a região também abriga a pequena Ronda, que surpreende pelos cenários únicos.

Vista aérea de Ronda. No topo de um planalto, a oeste fica a “cidade nova”, com a Praça de Touros, e a leste, a “cidade velha”. Foto: Günaydin Hüzün

Neste post pretendo rememorar minha viagem a Ronda, em 2009, e espero fazer boas descrições dos pontos mais agradáveis dessa cidade surpreendente e admirável. Ao começar a escrever, tive várias lembranças da viagem e fiquei entusiasmado em poder passar os momentos tocantes vividos em cada mirante, esquina ou igreja de Ronda, instigante cidade da comunidade autônoma da Andaluzia e da Espanha.

Mas, para que se tenha ideia do sítio geográfico de Ronda, acho importante que entre e viaje no mapa abaixo. Caso não tenha familiaridade com o Google Maps, eu indico utilizar o Street View, uma das características mais interessantes dessa ferramenta, em que o boneco navegador, que se encontra na margem inferior direita, nos leva a caminhar por todas as vias e pontos importantes da cidade. Mas, para isso, necessita que você amplie o mapa de Ronda, clicando na janela à esquerda em: “Visualizar mapa ampliado”. Viaje!

Mapa de Ronda, na Andaluzia.

Bela vista aérea de Ronda, cujo fotógrafo fez uma rotação da posição original. É um lugar incrível. Foto: James Relf Dyer
Vista do Puente Nuevo de Ronda, com 100 m de altura.

No topo de um planalto rochoso, muitas construções de Ronda foram erguidas quase na beirada de precipícios e penhascos. Esses paredões impressionantes fazem parte do cânion do rio Guadalevín, que corta a cidade. O cartão-postal de Ronda é o Puente Nuevo (“ponte nova”), construído no século XVIII com um arco enorme que se estende por cerca de 100 metros de altura, ligando os dois lados do cânion.

Outra posição aérea do Puente Nuevo. É assim mesmo que ela é conhecida em Ronda, mas na tradução para o português seria: “Ponte Nova”.

Ronda fica na porção oeste da província de Málaga, na Andaluzia, na região sul da Espanha. A cidade fica no topo de uma montanha que alcança 739 m acima do nível do mar entre a Serra de Grazalema a oeste e a Serra das Neves a leste. É cortada por um desfiladeiro que separa a “cidade nova” a oeste, onde se localiza a Praça de Touros (clique para ver a localização), e a “cidade velha” a leste, onde se destacam as antigas muralhas, que serão descritas mais adiante. A cidade fica a 723 m de altitude e está localizada a 178 km de Granada, ​​130 km de Sevilha e a 102 km de Málaga. Ronda pode ser alcançada de várias regiões da Espanha, entretanto, por se localizar no extremo sul do país, as distâncias são consideráveis. Para encurtar as distâncias o aeroporto mais próximo encontra-se na cidade de Málaga.

Bela vista da “cidade velha” de Ronda. Em destaque, à esquerda, as muralhas e a linda e imponente Igreja de Santa Maria La Mayor.

Em outubro de 2009 defini que iria fazer uma longa viagem de carro que começaria em Valença e depois de uns 12 dias chegaria a Madrid, e nesse grande percurso conheci Ronda, Mojácar, Granada, Sahara de la Sierra, Sevilha e Setenil de las Bodegas, uma cidade incrível construída por entre uma formação rochosa. Clique para ver o post: (https://novosterritorios.com/setenil-de-las-bodegas-a-forca-das-rochas/). Como Ronda é mais próxima de outros “pueblos blancos” e por ter uma bem servida rede de hotéis e restaurantes, eu me instalei por 4 dias no Hotel Arunda I, num quarto muito agradável com varanda e uma boa cama, e assim visitei outras cidades.

No Hotel Arunda I, hospedei-me no 1º andar, num quarto agradável e com varanda.
A Calle “La Bola” é o eixo central de Ronda e os restaurantes colocam suas mesas dispostas na parte central da rua.

Depois de me acomodar no hotel fui almoçar num restaurante onde as mesas são dispostas na Calle “La Bola”, antiga área onde ocorriam os jogos de bola. Saindo para caminhar pelas ruas da área da “cidade nova” de Ronda, o que primeiro avistei foi a Praça de Touros, inaugurada em 1785. Essa arena para as touradas é indicada como das mais antigas da Espanha. Para mais informes sobre a visita à Praça de Touros pesquise o site – https://www.rmcr.org/es/visita.html. É importante ressaltar que as touradas já eram organizadas nas praças das cidades da Espanha antes da existência das arenas, e Ronda é considerada como um dos berços das touradas. Na Espanha é proibido proibir as touradas e é um aspecto importante na cultura dos espanhóis, mesmo que muitos possam vir a ter reticência.

Estátua representativa de um touro bravo, localizada na Plaza Teniente Arce, nas proximidades da Praça de Touros.
Praça de Touros de Ronda, com seus dois andares de arquibancadas e a arena onde ocorrem as touradas.
Vista aérea da “cidade velha” de Ronda que se tem acesso a partir da Puente Nuevo.

Foto do site: https://www.istockphoto.com/br/search/2/image?phrase=Ronda%20NOT%20white%20background.

Próxima da Praça de Touros localiza-se a ponta do penhasco de Ronda, de onde se tem uma vista deslumbrante da planície composta por diferentes rios. Esse ponto da cidade traz ao visitante muitas sensações. De acordo com a característica de cada um, alguns sentem um frio na barriga devido à altura; outros, um perturbador fascínio devido à pura beleza da paisagem; e ainda uns podem sentir muita emoção ao estar num ponto tão mágico e delirante de Ronda. O que você sentiria se estivesse no Mirador de Ronda?

O Mirador de Ronda. Ponto de onde se visualiza o vale do rio Guadalevín.
O Mirador do Paseo de Blas Infante, que fica próximo ao Mirador de Ronda.

Cheguei a Puente Nuevo, de onde a vista continua deslumbrante como a do Mirador de Ronda (clique para ver a localização). As sensações tornam-se tão fortes que não acredito que um visitante não sinta um intenso frio na barriga. Respirei e fui em direção à “cidade velha”, onde se concentram os mais importantes monumentos históricos e os pontos turísticos mais aprazíveis que remontam a três importantes momentos da história de Ronda: a fase do Império Romano, o auspicioso período de oito séculos dos mouros e, ao fim, a reconquista cristã da Andaluzia pelos reis católicos no séc. XV. Foi em Ronda que os mouros mais resistiram contra sua expulsão da Península Ibérica, pois a cidade tinha sido preparada para causar embaraço a qualquer inimigo, situada no topo de uma região de montanha, com muralhas, torres de vigia e portas de defesa, cujos árabes se estabeleceram em pontos bem estratégicos para avistar o inimigo e se possível não serem derrotados.

A Puente Nuevo ou “Ponte Nova” é o principal acesso até a “cidade velha” de Ronda.
Desde a Puente Nuevo podem ser visto os “Jardins de Cuenca”, que passam a ideia de que estão pendurados sobre o abismo.

Antes de continuar a caminhada em direção à “cidade velha” de Ronda, logo após passar a Puente Nuevo, avista-se o fabuloso prédio do antigo Convento de Santo Domingo, que foi encomendado pelos reis católicos logo após a conquista da cidade, no séc. XV. No séc. XVI, foi sede do Tribunal da Inquisição. Atualmente é o Centro de Conferências de Ronda, e as laterais do prédio são ocupadas por cafés, restaurantes e lojas comerciais. Um desses espaços na lateral do Convento de Santo Domingo é ocupado pela loja de produtos da Andaluzia, como vinhos de Ronda, o jamón andaluz e outros presuntos típicos. A Ronda gourmet Armiñán está situada na Calle Armiñán, nº 1, num ponto muito central de Ronda. 

O antigo Convento de Santo Domingo fica perto da Puente Nuevo e hoje é ocupado pelo Centro de Conferências de Ronda.
A Ronda gourmet Armiñán, uma vinícola andaluz, está situada na Calle Armiñán, nº 1.
O interior da loja Ronda gourmet Armiñán, com queijos, jamón e petiscos típicos da Andaluzia.

Lembro-me bem que em Ronda tive um dia muito especial, e nesse momento que me debruço diante do computador recordo-me com muita clareza o caminhar até chegar à praça Duquesa de Parcent ou a Plaza Mayor de Ronda (clique para ver a localização). Esse segundo nome é usual à principal praça de uma cidade na Espanha. Não planejei visitar nenhum prédio em particular, pois estava imbuído de caminhar pela cidade. Entretanto, indico uma visita à Câmara Municipal de Ronda, com uma bela fachada, onde o primeiro piso é formado por janelas no estilo gaiola, com gradeamento em ferro, sendo um modo de construção bem característico da cidade, e os dois níveis acima são totalmente formados por colunatas. Devido a essa mistura de estilos, não há certeza sobre a origem arquitetônica do prédio. Durante o séc. XVI parte dessa estrutura era utilizada como mercado público muçulmano.

A Prefeitura e a Câmara Municipal de Ronda, na Praça Duquesa de Parcent.

Foto do site: https://www.encirclephotos.com/image/the-town-hall-in-ronda-spain/

A Plaza Mayor é uma bela praça que na época árabe continha os edifícios mais representativos do reino muçulmano em Ronda: a Grande Mesquita, o Souk (antigo mercado muçulmano ao ar livre), a Prisão e o Alcázar (castelo ou fortaleza que era usado para hospedar reis ou governantes). Entretanto, depois da reconquista cristã, os antigos prédios mouros passaram a ser a igreja Matriz, a casa pública de comércio de produtos, a Câmara Municipal – no local que abrigava a prisão, hoje suprimida – e a prefeitura, e ainda existem ruínas do Alcázar. Hoje a Praça Duquesa de Parcent ou Plaza Mayor tem um conjunto de monumentos que, sem dúvida, atrai os visitantes. Eu adorei esse ponto de Ronda e ao circular pela praça fui gostando de ver os belos edifícios, sendo que a Igreja de Santa Maria La Mayor se destaca com toda a sua imponência.

A Igreja de Santa Maria La Mayor na Praça Duquesa de Parcent.

A Igreja de Santa Maria La Mayor possui dois níveis de balcões que foram construídos na mesma época que a torre do campanário. Essa fachada é muito rara para uma igreja católica, mas os balcões vêm cumprir as características culturais dos mouros, onde a nobreza e as autoridades contemplavam as corridas de touro e outros atos públicos que se realizavam na praça. Inicialmente, a igreja foi erguida dentro da estética gótica. No entanto, o terremoto de 1580 provocou graves danos à sua estrutura, que acabou sendo reformada e ampliada no estilo renascentista. O minarete da Igreja de Santa Maria La Mayor foi o que sobrou da antiga mesquita do século XIII. A Praça Duquesa de Parcent me deixou bastante magnetizado, e para melhor usufruir da energia do lugar sentei-me no Café Mondragón, onde me hidratei, pois estive em Ronda num mês de outubro com dias claros e sol a pino.

A Igreja de Santa Maria La Mayor, à direita, e o Convento da Caridade das Irmãs da Cruz, à esquerda, com sua bela e enorme porta de madeira e um distinto arco.

Foto do site: https://pixels.com/featured/plaza-duquesa-de-parcent-ronda-andalucia-spain-tony-crehan.html

As mesas do Café Mondragón em frente à porta do Convento das Irmãs da Cruz.

Após o descanso no Café Mondragón, saí caminhando até chegar num largo onde avistei o Palácio de Mondragón, uma edificação cuja fachada é de tijolos aparentes, com uma forte cor de barro e duas torres quadradas. Foi construído no séc. XIV para ser residência de familiares dos sultões mouros que dominaram a região da Andaluzia. Em 1485, após conquistarem Ronda, os reis católicos fixaram residência no palácio durante a estada na cidade. Após a saída da família real, o prédio foi transferido às mãos do Capitão de Mondragón e hoje é ocupado com o Museu de Ronda. Eu o visitei e são imperdíveis os belos mosaicos do pátio interno, além da vista impressionante a partir do jardim, no segundo pátio do Palácio de Mondragón.

A fachada do Palácio de Mondragón contrasta com as casas brancas de Ronda, com tijolos aparentes e numa forte cor de barro.

Foto do site: https://www.iberian-escapes.com/things-to-do-in-ronda-pt.html

Uma vista impressionante e imperdível desde o jardim no segundo pátio do Palácio de Mondragón.
As moradias da “cidade velha” de Ronda são lindas, com portais talhados e janelas do tipo gaiola com gradeamento em ferro. Um estilo muito próprio da cidade.

Ronda é uma cidade que merece reservar mais de um dia para caminhar tranquilo por sua parte antiga. Depois da visita ao Palácio de Mondragón, fui até a região onde ainda se encontram as muralhas da “cidade velha”. As muralhas foram construídas no séc. XIII, com pedras alinhadas e superpostas, com várias torres, belos arcos e outras defesas internas. Portas e arcos ainda se encontram intactos, sendo que os mais importantes são o Arco de Felipe V, a Porta de Almocábar e a Porta de Cijara.

A Porta de Almocábar é um ponto turístico importante de Ronda.
O Arco de Felipe V foi construído em 1742. Foto: Raul Galicia.
A “Puente Viejo” é uma encantadora passagem de pedestres do séc. XVI.

Foto do site: https://umbrasileironaespanha.wordpress.com/2014/11/07/pontes-de-ronda/.

Um outro ponto muito destacado da “cidade velha” de Ronda é o antigo bairro do Padre Jesus, que é acessado após passar pelo Arco de Felipe V, construído em 1742 pelo primeiro rei da Casa de Bourbon na Espanha e caminhar até a “Puente Viejo” (clique para ver a localização), que é uma encantadora passagem de pedestres provavelmente do séc. XVI, pois não há confirmação de sua origem, e não existem evidências se a ponte foi construída pelos romanos ou se foi levantada pelos árabes. Mas, a partir da “Puente Viejo”, a primeira imagem que se vê é a Igreja do Nosso Padre Jesus, com uma fachada suntuosa de um alto portal gótico com três arcos na sua parte superior, local onde são dispostos os sinos.

Vista aérea do bairro do Padre Jesus. Em destaque a Igreja do Nosso Padre Jesus.
A Igreja do Nosso Padre Jesus e seu belo pórtico gótico, e a Fonte das Oito Bicas.

Foto do site: http://andaluciarustica.com/ronda_iglesia_de_nuestro_padre_jesus.htm.

Três fotos de outros pontos importantes em Ronda

Torre Minarete de San Sebastián. Foto do site: https://www.dreamstime.com/
A Igreja Nossa Senhora da Merced construída em 1585 e com realce a sua linda torre octogonal.
A Paróquia Nossa Senhora do Socorro que fica situada na Plaza del Socorro.

Para concluir esse passeio por Ronda vou relatar que o poeta tcheco Rainer Maria Rilke, autor de “Cartas a um jovem poeta”, esteve em Ronda de 9 de dezembro de 1912 a 19 de fevereiro de 1913, hospedado no quarto 208 do Hotel Reina Victoria, que hoje foi transformado no Museu de Rilke. O melhor de tudo são as palavras escritas pelo poeta:

“Procurei por toda parte a cidade dos meus sonhos e, finalmente, encontrei em Ronda. Não há nada mais inesperado na Espanha do que esta cidade selvagem e montanhosa” (Rainer Maria Rilke).

Gosto muito das palavras de Rilke, o poeta viajante, que recuperou em Ronda a inspiração e relaciona o processo criativo à necessidade de viajar: “Para escrever um único verso é preciso ter visto muitas cidades”.

Rainer Maria Rilke também escreve estas estrofes que nos indicam a caminhar mundo afora, pois aquilo pelo qual temos afeto nos enriquece.

“Sem paz, sem amor, sem teto,
caminho pela vida afora.
Tudo aquilo em que ponho afeto
fica mais rico e me devora”. (Rainer Maria Rilke)

Depois dessas palavras de um grande poeta, só me resta concordar e afirmar que o melhor é caminhar pela vida afora para conhecer muitas cidades e, quem sabe, começar a escrever lindas poesias de nossas vidas. 

Estátua de Rainer Maria Rilke nos jardins do Hotel Reina Victoria em Ronda.

Em 2009 viajei por várias cidades da Andaluzia, mas Ronda foi uma excepcional surpresa, pois as paisagens são indescritíveis. Indico que, ao planejar uma viagem à Andaluzia, faça um roteiro e conheça os lindos “pueblos blancos”. Não é um passeio caro e com certeza vão desfrutar de cidades como Setenil de las Bodegas, Casares, Gaucín, Sahara de la Sierra e outras. Boa viagem!

Compartilhe com os seus amigos.
Share on Facebook
Facebook
Email this to someone
email
Share on LinkedIn
Linkedin
Print this page
Print

7 thoughts on “Ronda – pueblo blanco, penhasco e Rilke.”

  1. Deve ser espetacular mesmo a vista de vários pontos da cidade! Lamento a cultura espanhola de touradas mas realmente Ronda é mais uma cidade que vale a pena conhecer ✈️

Gostou? Deixe aqui o seu comentário.