A Toscana não é bela, mas sim più bella.

Passar o tempo é algo muito salutar quando não se tem nada a fazer ou nenhum lugar para trilhar. Mas quando um viajante se encontra na Toscana o tempo fica curto e jamais para, pois é impossível ficar parado pensando na vida, já que é um território com belas e desconcertantes paisagens para serem desfrutadas. É inevitável sentir prazer e deleite por tudo que estiver ao alcance das vistas nos diferentes pontos dessa linda região da Itália. Comece a imaginar-se na Toscana e viaje comigo até uma dessas belas cidades de origem etrusca que é Volterra (clicar para ir ao mapa de localização da cidade).

Bela e desconcertante paisagem da Toscana.

Foto do site: https://dicasdaitalia.com.br/toscana/

As belas paisagens da Toscana estão ligadas às amplas regiões agrícolas com cultivo de inúmeros produtos como videiras (uvas), oliveiras (azeitonas), fruticultura de diversos tipos, horticultura, girassóis, beterraba para produção de açúcar, além de coleta de cogumelos, castanhas e trufas nas montanhas. É importante ressaltar que é uma região onde o manejo agrícola respeita os mananciais, os bosques, a vegetação dos vales e as matas nativas, como as florestas de pinheiros, e assim a riqueza da natureza bem manejada e preservada oferece imagens irretocáveis.

Mapa da Toscana, com Volterra e outras cidades.

Mapa do site: https://dicasdaitalia.com.br/toscana/

Em janeiro de 2013 fiz uma viagem de carro desde Veneza até Roma, por 15 dias, priorizando conhecer cidades da Toscana, como: Florença, Lucca, Pisa e Siena.  Mas Volterra me deixou com enorme vontade de voltar e espero conseguir na minha próxima viagem à Itália. Tive somente uma tarde para passear por Volterra e conforme caminhava por suas ruas e vielas ia percebendo o quanto as moradias, as igrejas, as torres e os arcos eram belos, muitos datando do séc. XIII, momento em que a cidade teve a construção de numerosas casas-torre, que serviam para a defesa das famílias nobres contra os inimigos. Mas no séc. XV, por conta de disputas e rixas familiares, a cidade de Volterra foi saqueada e os invasores derrubaram quase todas as casas-torre.

Vista aérea de Volterra, com uma harmonia arquitetônica incrível. Uma cidade medieval com a maioria das construções do séc. XIII.

Após ficar deslumbrado por essa vista impressionante de Volterra, onde há uma bela concentração de prédios medievais que se sustentam no tempo, apesar de invasões, incêndios, tremores de terra e saqueios, escolhi um lindo vídeo para o seu deleite. Normalmente coloco vídeos mais para o final da publicação, mas quis inverter a ordem com Volterra.

Volterra em belas imagens.

Como já comentei, estive em Volterra em 2013 e cheguei de carro um pouco sem saber por onde entrar na cidade, procurando um ponto onde houvesse estacionamento. A sorte foi que, da estrada que vinha desde Pisa, alcancei a Viale dei Ponti (clicar para ver a localização dessa avenida) e tudo deu certo, pois consegui um local seguro para o carro. Depois de alcançar uma rua, virei à esquerda e já estava na praça principal de Volterra: Piazza dei Priori (indico clicar para saber mais sobre essa praça medieval). Como fiz primeiramente esse caminho de entrada, somente depois de caminhar pela cidade é que fui conhecer as duas entradas típicas de Volterra, a primeira é a Porta all’Arco, construída pelos etruscos entre o séc. IV e III a.C., sendo um importante acesso à cidade pelo lado sul; e a segunda foi a Porta San Francesco, localizada no lado oeste, erguida durante a construção das novas muralhas da cidade no séc. XIII.

A Porta all’Arco construída pelos etruscos entre o séc. IV e III a.C.

Foto do site: https://pixabay.com/pt/photos/search/porta%20all%e2%80%99arco/

A Porta San Francesco, em Volterra, é uma das principais portas de acesso à cidade e faz parte das muralhas medievais.

O ponto central e o coração de Volterra é a Piazza dei Priori, uma área retangular irregular com a presença de prédios que foram tomando importância à medida que eram designados para determinadas funções. O Palazzo dei Priori é atualmente a sede da municipalidade de Volterra e, por ter sido inicialmente utilizado, durante alguns séculos, como residência e local de trabalho dos “prioris” – servidores contratados para a prefeitura -, tem seu nome justamente dedicado ao título desses servidores do povo.     

O Palazzo dei Priori atualmente é a sede da prefeitura de Volterra.
Bela rua medieval com típicas moradias de Volterra.
As ruas de Volterra são encantadoras. Essa é a Via Porta all’Arco.

As cidades-estados que existiram no território da atual Toscana durante a Idade Média, bem antes da formação da nação italiana, eram bastante belicosas, com rivalidades internas, entre famílias, e externas, entre cidades. No ano de 1427 a cidade de Volterra foi controlada por Florença ( https://novosterritorios.com/florenca-o-centro-do-renascimento/ ), que iniciou a cobrança de altos impostos. Mas o povo da cidade se revoltou contra a opressão dos florentinos, e o priori Giusto Landini liderou a expulsão do invasor. Ao final de 1429 ele foi traído pelos nobres e prioris de Volterra, que o convidaram para uma reunião no Palazzo dei Priori e o atiraram pela janela. Então, Florença dominou novamente Volterra.

Vista desde a Viale dei Ponti (ponto panorâmico), destacando o Batistério di San Giovanni (construção octogonal) e o Campanário da Catedral de Volterra.

Como o meu tempo na cidade foi bem curto, apenas vi a beleza da fachada da Catedral de Santa Maria Assunta muito rápido, e mesmo que eu quisesse não poderia visitá-la, pois se encontrava fechada. A catedral de Volterra foi destruída, assim como a maior parte da cidade, após um terremoto em 1117 e foi sendo reconstruída e ampliada até o final do séc. XV, quando a torre sineira atual substituiu uma mais antiga, que por sinal é um ponto de destaque na cidade, por ser bem alta e vista de diferentes mirantes. 

A Catedral de Santa Maria Assunta, em Volterra, e a alta torre sineira.
No interior da Catedral de Santa Maria Assunta, suas colunas decoradas com um material que imita o mármore rosa.

Já quase escurecendo, cheguei ao mirante de onde se pode ter uma vista linda e quase infinita das terras de Toscana, além do Teatro Romano, uma obra do séc. I a.C., cuja plateia foi construída numa região de encosta natural. A vista do Teatro Romano de Volterra desde esse ponto do alto da cidade me fez lembrar o Teatro de Herodes Ático, que também foi erguido numa encosta natural na base da Acrópole de Atenas. É muito lindo visitar uma cidade medieval e ainda encontrar ruínas da arquitetura de outras civilizações. E o mais fantástico é que tem menos de 6 anos que uma equipe de arqueólogos italianos começou a escavar e catalogar um tesouro que foi descoberto de forma acidental: o Anfiteatro Romano de Volterra. 

Essas são as belas ruínas do Teatro Romano, que foi desencavado em 1950.
Esse é o protótipo do Teatro Romano, caso ele estivesse intacto até os dias atuais, reconstrução virtual do Prof. Wladek Fuchs.

Entre os muitos achados de Volterra, o mais impressionante começou a tomar forma em agosto de 2015, em um pequeno vale perto do cemitério e não muito longe do local do Teatro Romano em Vallebuona. Aparentemente se desconhecia que nesse local poderia existir uma tamanha estrutura romana do séc. I a.C. com a capacidade de abrigar, durante sua existência, até dez mil pessoas. Esse arcabouço estava essencialmente coberto por uma espessa manta de terra e areia que o preservou muito bem.

Posição exata da localização do Anfiteatro Romano de Volterra, num terreno descampado ao lado do cemitério.

Foto do site: https://redhistoria.com/descubren-un-coliseo-romano-en-volterra/

O Anfiteatro Romano foi descoberto por obras públicas implementadas para dragar leitos de rios assoreados, aplainar terrenos e restaurar vias e logradouros, após Volterra sofrer uma sequência de catástrofes provocadas por fortes chuvas que afetaram a cidade e seus arredores. Essas obras foram levadas a cabo por uma empresa de hidráulica que, ao iniciar escavações num terreno próximo ao cemitério, percebeu a presença de artefatos em seu interior. Com testes e sondagens geoelétricas, confirmaram o importante achado do Anfiteatro Romano em Volterra, ao final de 2015, tido como “a descoberta arqueológica do século”.

As ruínas do Anfiteatro Romano de Volterra após as escavações. Foto: Alessio Guiggi.

É interessante a explicação da presença do corredor da morte no Anfiteatro Romano de Volterra, que era o local onde os gladiadores ficavam à espera para entrar num coliseu romano ou num anfiteatro, cujos espetáculos de entretenimento cativavam as massas com sangue e coragem.

“Após os primeiros estudos realizados no local, descobriu-se que o coliseu é construído em pedra e decorado com panchino, uma pedra ornamental nativa de Volterra e que tem sido usada desde os tempos dos etruscos, (…) os arqueólogos descobriram uma grande pedra totalmente esculpida e também o que parece ser o acesso abobadado a um criptopórtico ou passagem coberta, que eles suspeitam que poderia ser o corredor no qual os gladiadores ficavam antes de entrar na arena para lutar e dar um show aos presentes no coliseu”. (Trecho retirado do site: https://redhistoria.com/descubren-un-coliseo-romano-en-volterra/).

Parte do Anfiteatro Romano de Volterra surgindo após a escavação empreendida pelos arqueólogos italianos. Foto: Alessio Guiggi

Um outro ponto da cidade de Volterra que é bastante visitado pelos turistas é a Acrópole Etrusca, localizada no topo de uma colina numa das extremidades do Parque Enrico Fiumi, próximo à Fortaleza Medici. É uma área que inclui as estruturas em ruínas de edifícios de várias épocas, desde a etrusca, assim como o exemplo da cisterna romana que se encontra no mesmo terreno. Quanto às edificações medievais, algumas são construções para fins religiosos. Sobre essa acrópole existem documentos que comprovam a ocupação contínua desde a Idade Média do Bronze, entre os sécs. XIV a XVIII a.C.

Ruínas da Acrópole Etrusca em Volterra. Foto: Tania d’Ascenzo.

São escassos os vestígios para se atestar o período mais antigo do povoamento dos etruscos no atual território de Volterra, mesmo assim foi encontrada uma interessante estratificação de edifícios etruscos, que datam do séc. VIII a.C. ao séc. I a.C.. Entretanto, com a ocupação romana, novas estruturas de prédios romanos do séc. I a.C. até III d.C. foram erguidas no mesmo local da Acrópole Etrusca. Um exemplo mais destacado é a presença da Cisterna Romana. A arquitetura etrusca, de fato, distinguia-se, comparada à grega ou romana, pelo uso em grande quantidade de materiais perecíveis, como madeira, terracota e barro bruto, com os quais foram construídos todos os edifícios, mesmo os mais importantes, como os templos. Para melhorar a estabilidade e proteger as paredes da erosão, os edifícios poderiam ter uma base de pedra, que é a única coisa visível, hoje, na Acrópole Etrusca de Volterra.

Belo afresco de Benozzo Gozzoli (1459) mostra os membros da importante família Médici de Florença. Crédito: Wikimedia Commons

Vamos agora voltar à época medieval e visitar a Fortaleza Medici, construída no alto de uma colina, cuja posição estratégica a transformou num local de controle de toda a paisagem circundante. O imponente edifício, concebido para proteger a cidade, é claramente visível mesmo a quilômetros de distância. A fortaleza foi concluída em 1474, exatamente dois anos após a conquista de Volterra por Florença. Apesar do nome, as origens da fortaleza são anteriores à ascensão da família dos Médicis de Florença. A parte sul começou a ser construída pelo conde de Briene, Walter VI, um nobre de origem francesa que foi nomeado governador de Florença em 1342.

A Fortaleza Medici é um belo e suntuoso prédio no estilo renascentista, cuja obra foi concluída em 1474.

Foto do site: https://www.bella-toscana.com/volterra/.

A Forteza Medici foi, na maior parte de sua existência, um local de prisão de alta segurança. Há alguns anos ela foi aberta para as excursões e posteriormente foi inaugurado o “Restaurante Fortaleza Medici”. Para usufruir desse espaço bem raro que é utilizado como um restaurante para os viajantes, na entrada todos são revistados por meio de um mecanismo de busca de metal. Os visitantes têm a oportunidade de vivenciar uma verdadeira forma de prisão, o que torna as impressões do lugar ainda mais perceptíveis.

O restaurante mantém ainda um importante diferencial: todo o seu quadro de funcionários é formado exclusivamente por presidiários que estão na fase final de suas penas, mas ainda se encontram presos no antigo presídio. São eles que cozinham e servem a comida para os visitantes.

O Restaurante Fortaleza Medici fica localizado na antiga sala de jantar dos presidiários da Fortaleza Medici em Volterra.

Foto do site: https://www.orangesmile.com/extreme/en/exotic-restaraunts/fortezza-medicea-restaurant.htm.

A Fortaleza Medici é uma bela e suntuosa construção no estilo renascentista que se impõe por sua opulência e posição estratégica em Volterra.

Bela visão da Fortaleza Medici em Volterra.

Foto do site: https://www.marcopolo.tv/volterra

Para concluir nossa viagem a Volterra vou postar fotos que eu tomei nos momentos finais da visita a essa cidade medieval tão rica em história. É aquela derradeira hora da correria, que no meu caso foi quando começou a escurecer. Mesmo que as fotos não representem bem o ambiente de Volterra ao anoitecer, indico que você tenha essa experiência visitando-a com hospedagem de pelo menos uma noite num hotel da cidade, e assim poderá curtir um pouco mais e ter a ideia total da beleza dessa cidade.

Uma rua de Volterra no momento em que a cidade anoitece.
Um belo arco da cidade medieval de Volterra ao anoitecer.
Após o arco, virei à direita e me deparei com a Porta all’Arco, construída pelos etruscos, povo que começou a ocupação de Volterra.

Minha primeira experiência em Volterra fez com que eu planejasse um retorno em 2020, não tendo sido possível. Mas tenho bastante vontade de voltar para descobrir um novo arco, uma nova porta e ver como estão as escavações do Anfiteatro Romano. E talvez eu retorne em abril ou maio de 2020. Vamos?

A imagem de destaque foi retirada do site: https://www.bella-toscana.com/volterra/

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12 thoughts on “Volterra – cidade etrusca na Toscana.”

    1. Luisa, seguidora do blog. Eu também gosto muito de estar por entre muralhas e se puder, subir nas torres medievais. Volterra é uma cidade impressionante por sua riqueza histórica.

    1. Hélida, seguidora do blog. Agradeço por suas palavras. Realmente a Toscana é linda e deslumbrante e tem sempre uma novidade a descobrir.

  1. Lindíssimo e inspirador o teu texto, Ronaldo. Mais do que uma narrativa, é uma fabulação que nos leva ao sonha. A região da Toscana, pra mim que já percorri mais de uma vez, nunca foi tão deslumbrante quanto agora por teus olhos. Belas fotos. Volterra é lindíssima. Obrigada por esse presente.

    1. Maria Helena, amiga e seguidora do blog. Agradeço por suas palavras. Realmente a Toscana é linda e deslumbrante e tem sempre uma novidade a descobrir.

  2. A Toscana é realmente belíssima!! Não conheci Volterra mas fiquei com vontade depois de ler esse post! Lindas fotos!!

    1. Isis, amiga e seguidora do blog. Espero que meu post tenha lhe influenciada a marcar uma visita a Volterra, pois eu também espero voltar. Obrigado pelo comentário…

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