Na Idade Média, uma família de barões importantes da região de Girona estabeleceu-se em uma das colinas da Serra de Finestres, no que é hoje o Parque Natural da Zona Vulcânica de La Garrotxa. Pouco a pouco, a população começou a crescer e assim nasceu Santa Pau. Ainda hoje a cidade possui a essência de um centro de poder econômico e comercial do período medieval.

A cidade medieval de Santa Pau, com a ruína do Castelo de Santa Pau ao centro.

Foto do site: http://escaladuix.org/wp-content/uploads/2012/11/Sta.Pau_.jpg

Santa Pau fica no sudeste da planície de Olot, numa região vulcânica, no meio de um vale cercado de cadeias montanhosas, sendo Santa Maria de Finestres a mais importante. A cidade fica a 496 m acima do nível do mar e está localizada a 140 km de Barcelona, ​​50 km de Girona e a 10 km de Olot. A estrada de Banyoles para Olot é o único meio de comunicação, cruzando Santa Pau. Para alcançá-la, se não for de carro, a empresa TEISA (http://www.teisa-bus.com/) oferece viagens de ônibus com 5 horários/dia, saindo de Olot a partir das 7h15 até as 20h15, num percurso de 15 minutos.

O ônibus que liga Olot até Santa Pau.
Bela viela e suas antigas construções.

A aparência da cidade, construída principalmente nos séculos XIII e XIV, é tipicamente medieval, cercada por muros, torres e ruas irregulares e estreitas. A Plaça Major é o ponto central da cidade, com belas arcadas arredondadas, que desde 1297 (séc. XIII) tem o privilégio de ser uma área protegida para a realização de mercados e feiras. Alguns raros documentos mencionam que o Castelo de Santa Pau começou a ser erguido no século X, no ponto mais alto da vila, embora mais tarde tenha sido dada a aparência atual de uma grande casa senhorial. Por mais que tivesse pesquisado não consegui apurar uma data precisa da fundação da cidade de Santa Pau, mas é bem provável que desde o século X algumas casas senhoriais tenham sido construídas no local.

Fachada do Castelo de Santa Pau, desocupado e em processo de deterioração e desgaste.

Santa Pau nos faz lembrar vagamente a cidade italiana de San Gimignano e suas torres, sendo que Santa Pau tem apenas a torre da elegante igreja românica de Santa Maria, que data do século XIV. Santa Pau é como um museu vivo de monumentos, pois, além do castelo já mencionado, citado pela primeira vez em documentos que datam do século X, o centro histórico, ou “Vila Vella” em catalão, a charmosa “Plaça Major” e a igreja de Santa Maria datam do século XIII ou XIV. Como resultado de grande parte da municipalidade em manter suas construções medievais originais, Santa Pau foi declarada Monumento Histórico e Artístico, título outorgado pelo governo da Espanha em 1971.

As arcadas na Plaça Major de Santa Pau. Estruturas construídas no séc. XIII.
A Igreja românica de Santa Maria, na Plaça Major de Santa Pau.

Com toda a controvérsia quanto às datas dos monumentos e da fundação de Santa Pau, na Oficina de Turismo comenta-se que há na cidade construções do séc. IX, mesmo que sem comprovações históricas. O fato é que em Santa Pau realmente se viaja no tempo, qualquer viajante é tomado por essa sensação. Fiquei impressionado com a beleza dessa cidade medieval, e das suas antigas construções, considerando como seus prédios estão preservados e como ela ocupa um cenário deslumbrante. No dia de minha visita, fiquei surpreso por quase não compartilhar as ruas com outros turistas, pois esperava, ao menos, alguns grupos turísticos circulando. No entanto, além de poucas crianças e de um grupo de senhores, estávamos apenas eu e alguns moradores locais num passeio diurno.

Mapa pictórico da cidade medieval de Santa Pau.

Em vários momentos deparei-me com casas bem antigas e medievais, umas fechadas, outras talvez até desabitadas, mas que, infelizmente, não se podia adentrá-las. Numa delas, a porta estava entreaberta e, muito curioso, pude ver as mobílias e os utensílios dos proprietários, mas logo surgiram umas crianças que disseram morar ali e que não me deixariam tirar fotos do interior. Fiquei contrariado, mas consegui fotografar a parte externa da casa.

Moradia cujo interior não pude fotografar, mas onde vi antigos objetos e utensílios.
Casas geminadas medievais com fachadas em pedra.

Grande parte do território de Santa Pau faz parte do Parque Natural da Zona Vulcânica de La Garrotxa. Na região do parque há pontos de interesse especiais, como o Vulcão de Santa Margarida (que incrivelmente tem a pequena igreja de Santa Margarida, construída dentro da cratera do vulcão, hoje sem atividade), o Vulcão Croscat, a Argila Vulcânica, a Fageda d’en Jordà (uma linda floresta de faia, sobre a qual descreverei adiante) e no entorno da cidade existem várias cachoeiras.

A capela de Santa Margarida construída dentro da cratera do vulcão do mesmo nome. Foto de site free.

No Parque Natural da Zona Vulcânica de La Garrotxa, existem cerca de quarenta vulcões extintos. A última erupção foi há 11.000 anos, embora a área ainda seja sismicamente ativa. Atualmente essa região se transformou num lugar popular para caminhadas. Eu não tive tempo de estar na cratera de nenhum desses vulcões, mas tirei fotos do vulcão Croscat, e o vulcão Santa Margarida chama a atenção dos visitantes por terem construído uma pequena capela românica em sua cratera. Diz-se que assim o povo do lugar se protege contra erupções.

Mapa do Parque Natural da Zona Vulcânica de La Garrotxa, Catalunha, Espanha.

O cone lateral do vulcão Croscat. A foto foi tirada a partir da estrada entre Santa Pau e Olot.

Os vulcões praticamente inativos estão localizados entre a cidade de Santa Pau e Olot, são de fácil acesso, e, para quem gosta, vale programar uma caminhada para alcançar uma de suas crateras. Vale também conhecer como hoje está reconstituída a ladeira do cone do vulcão Croscat, cujo flanco nordeste e parte de sua cratera vulcânica original ficaram destruídos por causa da extração de cascalho, interrompida devido a muitos protestos na década de 1970.

O cone lateral do vulcão Croscat foi revitalizado, o que evitou a erosão da ladeira do cone.

Foto do site: https://www.tripadvisor.com.br/Attraction_Review-g911486-d10422829-Reviews-Volcan_Croscat-Olot_Province_of_Girona_Catalonia.html

Na década de 1990 foi realizado um projeto de paisagismo territorial para restaurar o local de extração de cascalho e recuperar a morfologia da base do vulcão e as pastagens que circundam a área. A obra de aterramento ganhou um prêmio de projeto paisagístico, evitou a erosão da ladeira do cone do vulcão e planejou o acesso público para fins educacionais. O vulcão Croscat é muito visitado.  

As arcadas arredondadas na Plaça Major de Santa Pau.

Foto do site:  https://br.pinterest.com/pin/575053446143829762/

Eu tinha apenas meio dia para visitar a cidade, já que saí, após o café da manhã, de Castellfollit de la Roca, chegando em Santa Pau por volta das 11h, entretanto queria estar em Rupit, minha próxima parada, antes do anoitecer. O trecho até chegar em Santa Pau levou uns quarenta minutos, então o tempo foi curto para conhecer essa interessante cidade medieval. Mesmo assim vivi momentos interessantes. Um deles foi quando, chegando ao mirante da “Plaça del Mirador”, comecei a escutar uma conversa entre alguns senhores em catalão, a língua nativa da Catalunha. Não entendi nada, e ficou claro que o catalão é bem diferente do espanhol, língua que domino. Em Rupit, conversei com jovens que me relataram que o catalão é uma língua falada somente pelos cidadãos mais idosos da Catalunha. 

O mirante da “Plaça del Mirador”, com a vista de Santa Pau. Em destaque, o castelo e a torre da igreja. Nesse local escutei a conversa em catalão.

Próximo de Santa Pau encontra-se uma floresta rara para a Espanha, pois sua vegetação necessita de locais com clima temperado a frio e solos bem drenados e moderadamente férteis, além de se adaptar bem em solos pobres em minerais.  As árvores do tipo faia formam densas florestas cujos solos recebem uma numerosa quantidade de folhas que, ano após ano, ali são depositadas. Essa massa de folhas é muito importante para que as sementes possam germinar na primavera, o que acontece com frequência, desde que haja alguma luz. A sua copa densa faz com que pouca luz chegue ao solo, não permitindo que haja desenvolvimento de outras plantas. Assim, o bosque de faia apresenta um solo densamente coberto de folhas e sem outras plantas. Esse tipo de árvore é denominado de “caduca” porque as folhas caem, o que acontece geralmente no outono. Quando viajamos para a Europa temperada no outono, é comum presenciar as folhas das árvores caindo levemente. É lindo!

O outono em Praga, uma região temperada, vemos as folhas das árvores caindo levemente. Uma sensação fantástica!

Floresta com árvores de folhas caducas.

Três florestas com árvores de folhas caducas: no verão as folhas são verdes, no outono elas caem e são amareladas e no inverno as árvores ficam sem folhas.

A floresta de faia que se localiza perto de Santa Pau é chamada, na língua catalã, de “Fageda d’en Jordà”, que se pode traduzir para floresta de faia da Jordânia. Essa floresta tem um tipo de faia excepcional, por estar plantada em uma lava resfriada proveniente do vulcão Croscat e situada em uma área plana, a 550 m (altitude baixa e rara para as faias da Península Ibérica). Além disso, a faia é cercada por vários vulcões da região de La Garrotxa. Por todas essas razões, a floresta “Fageda d’en Jordà” é um lugar místico que inspira artistas, poetas e, é claro, surpreende milhares de visitantes, todos os anos.

A Fageda d’en Jordà, rara floresta de faia cujas folhas caem no outono.

Ao viajar, sempre ocorrem momentos interessantes ou inesperados. Em Santa Pau tive um segundo momento que não estava previsto, mas criei a solução. Caminhei, emocionei-me, vivi a atmosfera do lugar e senti fome. Comecei a procurar um restaurante e ao passar por um rapaz pedi-lhe orientação de um bom lugar para comer “fesol”, um feijão branco bem saboroso, que é um prato típico da região. Ele me recomendou o restaurante Cal Fesol, onde entrei, me sentei e, ao olhar o cardápio, lembrei-me que tinha pouco dinheiro, pois a maior parte estava na mala e o carro estava estacionado distante dali. Não pude almoçar. Com poucos euros, a solução foi comprar um sanduíche e algo para beber. Em viagem, o imprevisível se resolve de forma rápida.

O restaurante Cal Fesol onde não pude comer o fesol de Santa Pau por estar com pouco dinheiro.
O fesol é um feijão branco típico da região de Santa Pau. Muito gostoso.

Minha viagem à vila de Santa Pau foi incrível, já que a cada momento me deparava com casarios, arcos, arcadas, vielas, torres e outras estruturas arquitetônicas que denotavam o tempo decorrido de cada uma. Assim, senti-me muito feliz por ter escolhido Santa Pau como uma das cidades medievais da Catalunha para visitar. Quero presenteá-lo com mais fotos dessa pequena cidade medieval que, em número de habitantes, é minúscula, com 1.565 hab. (dados de 2019), entretanto Santa Pau é maiúscula por sua enorme força primordial que a fez se perpetuar por séculos e séculos.

Fotos da cidade medieval de Santa Pau, onde se viaja no tempo.

Detalhe para o caibro de madeira maciça na porta, algo bem normal em casas medievais.
Belo bougainville junto a muralha de Santa Pau.
Bela arcada arredondada e, à esquerda, uma bica d’água.
Carrer Vila Vella em Santa Pau. Foto: Fèlix González
Belas flores penduradas, uma forma de embelezar uma casa.
Linda casa senhorial na Plaça Major, próxima à Igreja. Foto: Alberto C.
Portal de entrada na Vila Vella de Santa Pau.
Torre lateral da muralha original do séc. X.

Como deve ter percebido, fiquei bem feliz por ter conhecido a cidade medieval de Santa Pau, pois ela é incrível. Acredito que muitos viajantes tenham a sensação de voltar no tempo. Foi muito rica a minha experiência, pois não há nada melhor na viagem do que se sentir acolhido pela atmosfera do local, por esse motivo fiquei muito satisfeito, além de vibrar a cada instante quando me deparava com construções arquitetônicas antigas que revelavam uma remota história impregnada.

E antes de encerrar nossa viagem por essa encantadora cidade medieval de Santa Pau, escolhi com muito carinho um belo vídeo, curta:

A você que planeja uma viagem a Barcelona, não fique somente lá, saia e conheça as lindas vilas e cidades medievais que a Catalunha tem a oferecer. Não foi um passeio caro para conhecer belas cidades do interior, como Tossa de Mar, Rupit, Pals, Besalú, Casttellfollit de la Roca e outras. Barcelona, sim, é muito cara. Boa Viagem!

A foto de destaque foi retirada do site: https://www.arcadadefares.com/en/activities/places-to-visit/santa-pau/

Compartilhe com os seus amigos.
Share on Facebook
Facebook
Email this to someone
email
Share on LinkedIn
Linkedin
Print this page
Print

9 thoughts on “Santa Pau – onde se viaja no tempo.”

  1. Uauuuuuuuuuuu!!!!!!! Que fantástico!!!! As arcadas arredondadas na Plaça Major de Santa Pau é demais… Como estou aprendendo com vocês. Showwwww!!! Parabéns!!!!!!!!!!!!

    1. Querida amiga Regina, que acabe a pandemia e possamos estar bem para por o pé na estrada ou num avião. Santa Pau é uma pérola medieval, ela é um cenário perdido no tempo.

    1. Marzulo, obrigado por conta dos seus elogios, mas é claro que Santa Pau ajuda muito, pois é uma pérola medieval e é um cenário perdido no tempo.

    1. Valeria, que acabe a pandemia e possamos estar bem para por o pé na estrada ou num avião. Santa Pau é uma pérola medieval. Que bom que você viajou de casa até Santa Pau.

  2. Na total impossibilidade de viajar, este blog tão bem escrito e ilustrado, faz um bem enorme.Traz a esperança de logo podermos visitar lugares lindos como Santa Pau.

    1. Tânia, espero que acabe a pandemia e possamos estar bem para por o pé na estrada ou num avião. Santa Pau é uma pérola medieval. Que bom que você viajou de casa até Santa Pau.

Gostou? Deixe aqui o seu comentário.